O que é Celas de aula?

Este blog tem por objetivo detalhar minha experiência como professora de uma unidade da Fundação Casa em São Paulo (antiga Febem)

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Esteriótipos, rótulos e preconceitos...

Eu sei que o mundo não progride sem pesquisas, mas às vezes esses pesquisadores viajam na maionese! Outro dia saiu uma pesquisa dizendo que os carecas tem maior chance de ter câncer de próstata, que advogados com mais de trinta anos preferem os cãezinhos yorshires, que quem come três folhas de alface por dia tem mais resistência nas unhas. Para que serve isso?

Algumas pesquisas são de uma inutilidade absurda, outras prestam um "desserviço" social, reforçam, muitas vezes, ideias preconceituosas, como por exemplo a medicina de Lambroso. Fiquei pensativa quando li uma pesquisa que dizia que adolescentes que assistem filmes violentos ou jogam vídeo games agressivos são mais violentos e desenvolvem um potencial de criminalidade. Balela!

Perguntei para os meus alunos sobre vídeo game ou filmes violentos. A grande maioria NUNCA jogou vídeo game, nem gosta de ver filmes na televisão, ou seja, o vídeo game não foi o responsável pelas ações dos meus alunos, menores infratores. Pelo que ouvi dos meus alunos, o que os levou ao mundo marginal foi a desigualdade social, a falta de educação, de emprego, de escolas, de dignidade, de moradia, isso tudo é produzido via corrupção e descaso, via políticas públicas tão inúteis quanto algumas dessas pesquisas.

Um dos meus alunos disse que o que o levou ao mundo do crime foi a ganância, minha curiosidade me fez perguntar mais, mesmo sabendo que não deveria. Ele disse que entrou armado numa casa no Morumbi porque queria dinheiro para comprar um tênis. Isso era a ganância dele,  ele contou: "apanhei feito um cachorro, e a arma era de plástico"

Quando perguntei sobre o que eles mais fazem na vida, a resposta foi em uníssono: futebol! Se fosse fazer disso uma generalização, diria que o futebol é o responsável. Um perigo, visto que nossa nação produz e vende futebol. Somos craques nisso. Simplificações são tentadoras neste mundo onde tudo é mais complexo que parece. É quase um insulto quando encontramos uma morena burra, uma loira inteligente, um poeta rico, um político honesto. Preferimos conviver com esteriótipos porque eles facilitam nossa vida, menos uma coisa pra pensar. Estatística e pesquisas existem para duas coisas: confirmarem tendências ou para serem questionadas.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

"Paz sem voz.....♪♫♪♫♪♫"

"Para bom entendedor meia palavra basta".

Todos os dias ouço a seguinte pergunta quando entro na sala dos professores: "E ai professorinha? Ainda quer mudar o mundo?" Sempre sou gentil, respondo e brinco, porém entendi que a pergunta é na verdade uma afronta, uma crítica as minhas aulas, que costumam ter mais alunos que deveria. Isso não é problema pra mim, e nem deveria ser pra ninguém, até porque o salário é o mesmo independente de quantos alunos estiverem em cela. Tenho muito que trabalhar e estudar, não faz parte do meu repertório disputar aluno.

A resposta é uma: não tenho a pretensão de mudar o mundo, mas não quero que o mundo me mude para pior!  A "burrocracia" e falta de vontade trabalhar é doentia. Os baixos salários não justificam ninguém ir até a Fundação fazer de contaque trabalha. Quando vamos dar aula já sabemos que não ficaremos ricos, com poucas exceções. O que tenho a oferecer é meu trabalho, minhas aulas, minha boa vontade e dedicação.Não estou defendo aqui os baixos salários, MUITO pelo contrário, eles também me afetam profundamente, porém isso não é motivo para "fazer de conta"que trabalha.

Acho que tá dado o recado "(in)diretamente", de forma tão sutil que só faltou colocar o CEP a quem é endereçado.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

"♫ Moro num país tropical, abençoado por Deus e Bonito por Natureza ♫"

Sobre minha remuneração:

Sou professora do Estado de São Paulo desde Junho de 2011. Desde então fui OBRIGADA a abrir uma conta no Banco do Brasil, no qual eu pago mensalmente uma tarifa de $19,95. Este valor é cobrado pelo serviço básico do banco, ou seja, conta corrente e saques nos caixas eletronicos. 
Numa continha rápida, já paguei o total de tarifa $79,80. A cada ida  para a Fundação Casa gasto $6. Estando lá desde Junho, indo 3 vezes por semana, gastei $180,00. Algumas vezes tive uma "convocação"para reuniões, era um comunicado no estilo "gostaríamos muito que você VENHA a reunião". Fui. 
Acrescente a nossa continha mais $18, referente aos passes de ida e volta de 3 reuniões.
Para dar aula na Fundação, nós professores, precisamos usar avental, sem ele não podemos entrar em Celas de aula. Fui até a 25 de março e comprei um pela "bagatela" de $25, mais os passes de ida e vinda, ou seja, mais $6.
Conclusão: gastei $ 308,80!

Pergunta óbvia: quanto recebi?? NADA! Diz a secretaria que houve um problema no meu cadastro, enquanto isso trabalho, "voluntariamente",de graça :(
Parece até que salário é beneficio, fico sem argumento contra a pressão familiar, porém meu medo é ficar ainda mais sem argumento depois de receber. Seria cômico se não fosse trágico!


O mais importante é que :"♫♫ Em Fevereiro (em Fevereiro); tem Carnaval (tem Carnaval) Tenho um fusca e um violão; sou Flamengo, tenho uma nêga, chamada Tereza ♫♫"









quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O sorriso de Jaqueline Roriz

Este blog não tem por objetivo tratar de política, corrupção, eleições, embora eu adore estes temas, e as vezes fico tentada a escrever sobre. O propósito é contar um pouco das minhas experiencias em Cela de aula, e se estes temas aparecerem por lá, serão tratados aqui também. Com a Roriz nas mídias era de se prever que alguém perguntaria sobre este episódio. Fui no trajeto pensando o que falar, como explicar o inexplicável? Como explicar que mesmo pega com a boca na botija ela foi absolvida por seus pares?

Existem dois tipos de "meliantes"(acho esta palavra horrível!) no Brasil: o que paga pelo que fez e o que assina Roriz! Pensei neste argumento, mas achei sem fundamento. Foi então que tive uma ideia, e funcionou! Ao final da aula, um dos alunos me perguntou quem era o Kadafi, e logo em seguinda sobre a Roriz. Falar de Kadafi foi relativamente tranquilo, mas sobre e Roriz...

Comecei falando sobre o sorriso dela. Ela tem um cinismo quase de artista quando é flagrada, falta-lhe uma vergonha, uma intenção de esconder o rosto com as mãos e não encarar as cameras. Mesmo flagrada na farra do dinheiro público do DF, ela mostra que não se importa com os olhares de reprovação. A risada que deixou escapar no plenário mostra a certeza da impunidade e me remeteu a dancinha do mensalão, da deputada Ângela Guadagnin, do PT fez uma "dancinha" depois da absolvição de João Magno, também do PT. Para a próxima aula, pretendo levar videos dela, e detalhar melhor a situação. Preciso pensar mais como abordar este tema, de que forma para este público.

...O "mundão"deve muita explicação aos meus alunos, os menores infratores que cumprem medida sócioeducativa....